É conhecido o interesse dos mórmons pela investigação genealógica. Esta congregação religiosa, que também dá pelo nome de Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, financia, desde 1894, a Sociedade Genealógica do Utah, cujo principal papel é promover a preservação de fontes genealógicas em todo o mundo, para o que conta com uma numerosa equipa de especialistas e com cerca de 4.500 centros de história da família disseminados por cerca de 100 países. Fruto da cooperação estabelecida com as entidades responsáveis em cada país pela guarda de fontes relevantes para a história da família e para os estudos genealógicos, a Sociedade Genealógica do Utah iniciou a microfilmagem dessas fontes em 1938 e, actualmente, tem a decorrer mais de 250 projectos de microfilmagem em cerca de 45 países. Esse trabalho de pesquisa e de reprodução foi, em parte, posto em causa no passado dia 5 de Abril pela Congregação para o Clero, uma das congregações da Cúria Romana, órgão da Santa Sé. Nessa data, a referida congregação enviou uma carta às conferências episcopais de todo o mundo, instruindo-as para não facultarem registos paroquiais à Sociedade Genealógica do Utah e impedirem esta de digitalizá-los e microfilmá-los. Já numa missiva de 29 de Janeiro de 2008, outra congregação católica, a Congregação para a Doutrina da Fé, revelava ter “sérias reservas” sobre essas práticas. A orientação dada pela Igreja Católica explica-se por motivos doutrinais – ao fim e ao cabo, é também essa ordem de motivos que explica o empenho da Igreja de Jesus dos Santos dos Últimos Dias em recolher o maior número de fontes genealógicas possível. De acordo com o texto intitulado “Why family history?”, patente no site www.familysearch.org (serviço apoiado pela Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias), os fiéis mórmons vivos e os seus antepassados podem reunir-se em família no Além, desde que os primeiros, em nome dos segundos, façam determinadas promessas. Para que essas promessas sejam feitas, torna-se necessário que os entes vivos identifiquem os seus antepassados. Daí a importância das fontes genealógicas. Representantes da Igreja Católica põem a questão noutros termos. A decisão de obstaculizar o acesso dos mórmons aos registos paroquiais pretende prevenir que estes utilizem essa documentação para rebaptizar, a título póstumo e por substituição ou representação, os seus antepassados na fé que professam, com o propósito de se reunirem no Além. De acordo com a carta de 5 de Abril, tal prática põe em causa a confidencialidade do crente, além de ser “inaceitável do ponto de vista da verdade católica”, nas palavras do padre James Massa, director executivo do Secretariado para os Assuntos Ecuménicos e Inter-religiosos, da Conferência de Bispos Católicos dos Estados Unidos da América. À parte as motivações religiosas e doutrinárias que envolvem o acesso aos registos paroquiais em posse da Igreja Católica, é de assinalar a acção da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias em prol da preservação das fontes documentais genealógicas e da disponibilização das mesmas. Em Portugal, por exemplo, existem 23 centros de pesquisa, junto dos quais qualquer cidadão pode tentar traçar a sua árvore genealógica até ao século XVI. Tal é possível para os cidadãos de raízes portuguesas porque, fruto de um acordo com o Estado português, a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias tem vindo a microfilmar os registos paroquiais guardados pelas conservatórias do registo civil e pelos arquivos distritais. Pode acontecer, no entanto, que o microfilme que contém a informação pretendida tenha de ser pedido aos serviços centrais, em Salt Lake City, no estado de Utah, nos Estados Unidos da América, onde se concentra a informação recolhida pelos milhares de centros espalhados pela orbe, estando os suportes micrográficos originais depositados nas Montanhas Rochosas, a 200 metros de profundidade. À data de Dezembro de 2007, a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias em Portugal ainda não tinha microfilmado os registos paroquiais que estão na posse da Igreja Católica nas dioceses de Lamego e Bragança. Com a orientação entretanto dada pelo Vaticano, é provável que essa tarefa continue por se realizar nos próximos tempos.
Julho/2008 |
Sem comentários:
Enviar um comentário